Se todo o ser humano deveria usufruir duma vida digna tendo em conta que os avanços da ciência permitem hoje recursos que garantam a satisfação das necessidades básicas a todos, também na morte deveria haver a dignidade que se impõe a quem chegou ao fim do seu percurso.
Porém a morte não é democrática. É retardada pelos avanços da medicina a que só alguns têm acesso, dorme ao lado dos quase mil milhões que vivem no mundo em penúria extrema, arrasta-se pelos corredores da morte onde muitos Países insistem em colocar os seus condenados à pena capital (quase na totalidade pobres e desprotegidos) e exerce-se na guerra que ceifa populações indefesas constituídas maioritariamente por aqueles que não têm condições nem para fugir nem para pegar em armas.
Há quem defenda que a morte não se deixa comprar mas eu acho que se deixa. É inevitável, é certo, mas não se exerce com a mesma pressa consoante as resistências que encontra seja da medicina curativa ou preventiva, seja das muralhas com que se defendem os que dela se podem defender até ao último instante.
Basta analisar sumariamente a esperança média de vida em muitos locais da terra para que facilmente nos apercebamos dessa disparidade.
Nos Países desenvolvidos onde, apesar das diferenças, a morte é mais democrática, continua a haver um fosso considerável no acesso à dignidade de fim de vida.
Há os que são abandonados em lares e hospitais, que vivem sozinhos sem os apoios permanentes de que necessitam, ou que, em doenças terminais, servem de cobaias a experiências médicas, que por vezes lhes causam um enorme sofrimento, em troco do prolongamento da agonia.
E se a eutanásia dura e crua, poderá ser fracturante em muitos valores individuais e colectivos, já o recurso artificial a uma vida, que se torna por este meio mais indigna e mais sofrida, poderá merecer um consenso mais alargado quanto à sua rejeição. É que se trata de todo um poder de decisão que se exerce sobre quem não se pode defender e, muitas vezes, à margem da própria família, levando a cenários dolorosamente indignos pelo desrespeito do direito de morrer em paz.
Segundo notícia vinculada no JN, está em estudo na região espanhola de Andaluzia, um projecto-lei que determina que os médicos que adoptem medidas "inúteis de prolongamento de vida" a doentes terminais sem possibilidade de recuperação, poderão ser punidos com multas até um milhão de euros.
O projecto-lei refere ainda que o médico, ou médica, responsável pelo paciente, tem a obrigação de limitar as medidas de suporte vital quando não as considere necessárias para evitar a obstinação terapêutica e que essa justificação deve constar no historial clínico do paciente.
O texto obriga ainda a que a opinião do médico seja partilhada por, pelo menos, mais dois outros especialistas que conheçam o caso do paciente em questão.
Em casos em que os representantes ou familiares do paciente discordem da retirada das medidas de suporte vital, o médico pode pedir um parecer não vinculativo, cabendo-lhe depois a decisão final, inclusive contra a vontade da família.
Este projecto procura ainda regular o direito dos doentes terminais a receber toda a informação sobre a sua doença, a tomar decisões sobre o tratamento que podem aplicar e a recusar a intervenção proposta pelos médicos.
O projecto procura também assegurar os direitos dos menores de idade, estipulando que a partir dos 16 anos possam ser os próprios a decidir.
Este projecto-lei consubstancia assim muitas das preocupações que frequentemente nos assaltam quando, perante cenários de sofrimento e de debilidade extremos, deixamos em mãos alheias algo de importância tão vital como a dignidade na morte.
43 comentários:
Tema complexo, este da morte...muito há para dizer, mas ainda mais para meditar..
obrigada pela visita
abraço
Mais um excelente post! Com um tema que tem muito que se lhe diga...
Beijinho
-Tenho alguma dificuldade em falar da morte, e não me quero alongar, mas nem sempre ela oferece dignidade, mesmo a quem a possa pagar a peso de ouro, tal como alguns não têm direito ao mais pequeno retardar do inevitável, mesmo que pudessem comprar nem que fosse mais uns minutos, e não estou a falar de acidentes. Mas concordo com grande parte do texto.
Minha querida amiga Silencio.
Eu não concordo só com metade, eu concordo com o texto todo.Conheço pessoalmente um caso, duma filha que sempre adorou a mãe (filha única) de tal maneira, que em condições normais já teria morrido há dois, três anos. Mas acontece que aquela filha tem lutado, tanto, tanto, tem gasto tanto dinheiro que tem a mãe viva
(já muito velhinha)mas em condições vegetativa.
É isto vida?
Como é possível o amor chegar a tanto?
Beijinho
Um assunto muito delicado, em que entram também convicções religiosas e outras que igualmente devemos respeitar. Legislar é muito difícil nestes assuntos, mas é possível dar liberdade de escolha que permita respeitar a vontade e a dignidade mesmo na morte.
Cumps
Primeiro quero agradecer as tuas visitas ao meu espaço. Raramente aqui deixo comentário pelo que te peço desculpa mas reconheço que prestas um verdadeiro serviço público neste meio onde o número de aderentes é cada vez maior.
Um post para ler, reler e pensar. Há quem diga que no nascer e no morrer somos iguais. Não concordo. Temos princípio, temos fim mas as diferenças, essas, têm a ver com o poder económico. O dinheiro! Sempre o mesmo!
Beijinhos
Sou a favor da eutanásia, mas contra os critérios economicistas do limite à vida.
Lídia,
Sou da opinião que inevitavelmente chega sempre o momento em que somos obrigados a deixar em mãos alheias a importância vital da dignidade na morte. No entanto, e embora eu seja a favor da eutanásia, julgo que essa lei poderá ser demasiado polémica, e acabar por deixar os médicos numa situação desconfortável. Porque ter que ir contra a vontade da própria família, pode tornar-se demasiado penoso e até injusto caber aos médicos tomar essa decisão.
Bjo.
Quando tudo deixa de fazer sentido...quando o corpo acabou...
Doce beijo
Salve! Lídia
Nascemos para viver e morrer.
Então que seja dada à morte a dignidade que lhe é devida.
Porque só louvar alienada e fanaticamente a vida e abominar a natural evidência da morte?
Temos direito à vida? Sim, temos.
Temos direito à morte? Sim, temos. Pois a morte faz parte integrante do processo de estar vivo. É o seu culminar.
No Silmarillion Tolkien (o do Senhor dos Anéis) escrevia que a dádiva da morte foi dada aos humanos para que estes ficassem libertos do pesado fardo da imortalidade.
Abraço.
Salutas!
Olá Lídia,
este tema merece a nossa análise profunda. É um tema fraturante. Cada caso é um caso.
Sou contra o prolongamento da vida artificial -quando em sofrimento grave- quando não há esperança de vida. Mas há casos, por exemplo, em que depois de vários anos em coma, os pacientes regressam à vida. Isto é muito complexo para se dizer sim ou não, apenas. A eutanásia em determinados casos, de acordo com o doente capaz, deve ser aplicada a fim de minorar o sofrimento. Refiro-me às doenças graves que causem sofrimento, em estado terminal.
Penso que, hoje em dia, já é aplicado no quotidiano a escolha de utilização de máquinas de suporte de vida, mediante as neccessidades dos pacientes, tendo na altura, que ser escolhido a quem se desliga a máquina, para se aplicar a outro com esperança de vida.
Não esqueçamos a necessidade dos paleativos. Um método que deve ser incentivado cada vez mais. Morrer com dignidade, implica não sofrer. Temos que pensar que quando estamos em situação difícil poderemos estar dispostos a tudo para nos livrarmos da dor que nos atormenta. Haverá estados depressivos que nos podem empurrar ainda mais para a solução final.
Abraço
Sou a favor de uma vida sem dor....
Abraços
lidia
como ja sabe eu sou a favor da eutanasia.
viver em sofrimento onde a medecina ja nao pode ajuda(nao]
nunca prolongar o sofrimento, se ja nao ha remedio,nunca mesmo.
beijinho
Isso é bom...Ou não?
Esse é um tema difícil de ser opinado! Depende do ponto de vista de cada um...
Dentro da filosofia budista, que eu sigo, devemos deixar a vida acontecer até onde ela quiser...E necessitar.
Muito bom o seu enfoque!
Beijos de luz e o meu carinho...
Lidia,
Este tema, por razões que você sabe, é dificil para mim. Mas sou de opinião que devemos deixar que a natureza se encarregue de tudo. Mas acredito que cabe a nós cuidar da pessoa enferma da melhor forma que nos for possivel, E sempre com muito amor. Seja quem for essa pessoa.
Um abraço.
ótimo teu blog. Gostei muito daqui. Parabens, muito bom.
Tenha um belo final de semana.
Maurizio
Lídia, existem muitos médicos mercenários que prolongam a 'vida' de quem está 'morto em vida'. A família consente porque, nestas horas, sempre esperamos por um milagre. Acho difícil chegar em um consenso, mas veja que por outro lado, se não existissem os avanços da ciência, essa pessoa já estaria morta. É a vontade de Deus ou a nossa vontade que é imposta.
A pobreza no mundo tem que ser combatida. Em consequência o nível da qualidade de vida no mundo melhorará de forma significativa e morrer com dignidade será outra consequência.
Bom fim de semana! Beijus
É preciso ser rico para se viver mais...
Algo de muito errado se passa neste mundo...
Mas o vento vai mudar...
Sorriso grande para ti******:)))
Oie linda! Concordo plenamente! Não podemos deixar nossas vidas, a mercê de quem nada tem a ver conosco. Só nós podemos decidir sobre isso, ou no mínimo alguém bem ligado da familia e sempre pra benefício da saúde e do melhor.
Bom fim de semana! Beijos
Fazes muito bem em levantar a questão, Lídia.
Eu continuo a ser contra a pena de morte e , por coerência, contra a pena de vida!
Uma feliz semana para ti e para os teus.
excelente texto. oportuno.
o direito a uma morte digna é um avanço civilacional. e por isso deve/ria ser consagrado como direito humano fundamental.
abraços
Muito bem
complicado falar deste assunto, eu tenho a minha ideia, só minha que sigo, outros façam da maneira que achem melhor.sofia
Um projecto que merece todo o meu interesse e apoio, embora este apoio não sirva de nada.
Votos de uma boa semana.
Morte e vida... ainda acredito que a Deus pertençam. Cabe-nos, apenas, viver melhor, para merecermos a dádiva da Vida... Boa semana, Lídia!
(...)E se a eutanásia dura e crua, poderá ser fracturante em muitos valores individuais e colectivos, já o recurso artificial a uma vida, que se torna por este meio mais indigna e mais sofrida, poderá merecer um consenso mais alargado quanto à sua rejeição. É que se trata de todo um poder de decisão que se exerce sobre quem não se pode defender e, muitas vezes, à margem da própria família, levando a cenários dolorosamente indignos pelo desrespeito do direito de morrer em paz.
Como gostei de te ler, como as palavras bateram em mim , como se fosse eu a pensar nelas...
TODOS DEVERÌAMOS TER O DIREITO DE MORRER COM DIGNIDADE, SEM PRELOMGAMENTOS INUTEIS DE SOFRE(tanto fisica como moralmente).
Jinhos mil
Lídia. Venho agradeçer a visita ao blog.Sobre este tema,é realmente pertinente,pois viemos ao mundo todos da mesma maneira,mas realmente os de poder económico,tem escolha para poder dicidir sobre certas coisas,outros nem tanto assim penso eu?
Beijinho e boa semana
Muito bem lançado este tema tão controverso, num texto muito bem feito...
Antitudo
qual a diferença entre o suicídio e a eutanázia (excepto quem é interveniente). Sou de acordo que cada um acabe com a sua vida assim que o quizer mas não venham com falsas respostas que o suicídio é um horror.
Há coisas muito difíceis de legislar, mas não esta, porque cada um devia ter o direito de decidir por si próprio. As leis deviam ser feitas para proteger os outros, e não para impedir cada um de tomar decisões que só a si dizem respeito.
Velhos tempos em que se morria em casa, junto dos seus, o abade vinha dar a santa unção e depois morria-se. Anda Luzia, vem dar uma volta a Portugal.
Um abraço por uma morte de pé
Olá Amigo, este tema é polémico, mas concordo com o teu texto... Parabéns!
Um abraço,
Fernandinha
Querida Lídia, fiquei emocionada com as lindas palavras que você expressou por ocasião do aniversário do meu blog! Estou sem palavras para agradecer o seu grande carinho. Fico contente por contar com a sua amizade!
Um grande abraço!
Lidia,
Passei pra te deixar um abraço e te desejar UM BOM MÊS DE OUTUBRO.
Um abraço.
Querida, não vou estar por uns dias e venho deixar-te um abraço.
Lídia,
estou emocionado com tanto silêncio culpado...
Tens muito que comentar lá naquele canto onde o silêncio jamais pode ser culpado!
Se o entenderes é claro. Pois gosto de ouvir a tua opinadela.
abraço
Passei para deixar saudades e um beijo de amizade...este tema é polémico e muito complexo...ou talvez não, se calhar somos nós...beijos querida...
Lídia,
Este é um assunto quase tabu e daqueles mesmo fracturantes.
Tenho a minha opinião sobre o assunto mas é um tema em que não existem certezas. Cada cabeça sua sentença, respeito a opinião de todos mas prefiro reservar a minha acompanhada de uma série de dúvidas que a acompanham.
A dignidade na morte, sim. Como diz o Pata Negra, onde vai o tempo em que as pessoas morriam em casa junto dos seus.
Por coincidência, assinalei o que se passou com o Paul Newman, falecido esta semana.
Há um mês, pediu no hospital que lhe fosse deixado que regressasse
a casa para aí morrer em paz, o que aconteceu há dias.
Mas se hoje as famílias não querem os seus velhos...!!!
Desculpa o não comentário.
Um abraço
para falar sobre a eutanásia, ter-se-á que despir qualquer vestimenta religiosa, sob pena de não darmos a nossa opinião, os nossos sentires, mas tão só aqueles a que o "dever de unidade" do credo obriga.
Para mim, até é fácil, já não professo qualquer religião.
Ao contrário do que aqui li num comentário, os médicos não podem apelidar-se de "mercenários" quando prolongam a vida de um paciente, mesmo em estado terminal. É antes seu dever, e a ele estão obrigados pelo juramento de Hipócrates.
Entendo que o Homem é dono da sua própria vida e, portanto, tem todo o direito de lhe pôr cobro, quando assim o manifeste em estado de consciência.
Já no que respeita à família, ouvidos os médicos sobre a irreversibilidade da situação terminal do doente (comas profundos há vários anos, por exemplo, que geram vidas vegetativas) aí, creio que a ela competirá o assumir da total responsabilidade pela decisão.
Perante este tipo de casos, gostaria de saber quantos familiares estarão dispostos a sofrer ad aeternum por mor do seu culto religioso.
Deixemo-nos de hipocrisia e de beatitude!
Saudações.
Jorge P.G.
Sendo a morte uma das coisas que temos mais certa, há que saber morrer comdignidade. Eu sou pela eutanásia, a pedido do doente, ou, caso não possa manifestar directamente a sua vontade, por um conselho de família.
Abraço
Compadre Alentejano
Aplaudo este post!
Chega de hipocrisia e de fingir que...
Um beijo
Um excelente post! Para pensar, como é costume teu. Isto é serviço público.
Bem hajas!
Agradeço a visita à minha casa e as palavras amigas.
Beijinhos
Subscrevo o que foi dito sabiamente pelo Jorge P.G
PARABÉNS PELO TEU BLOG E EXCELENTE!!!
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