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NO PALCO DA POLÍTICA - TEXTO DE OPINIÃO


Custa a ver, sobretudo para quem ainda viveu no período da ditadura salazarista/marcelista, ao que chegou o Portugal de Abril. As liberdades não são mais que o sonho de uma noite de Verão perdido nos meandros de uma Constituição progressista e numa democracia que mais não é que uma espécie de ditadura controlada.
Que liberdade existe para meio milhão de desempregados a que se juntariam quase outros tantos se a real situação fosse toda contabilizada? É que só em 2006, emigraram 150.000 portugueses, muitos outros por não terem direito a subsídio não se inscrevem nos Centros de Emprego, e outros ainda – desempregados de longa duração – passam à situação de pensionistas aliviando as estatísticas dos desempregados mas não as dos encargos sociais do Estado.
Que liberdade existe para todos aqueles, mais de 200.000, que aguardam há longos meses por uma cirurgia, registando-se mesmo casos de doentes cancerosos há mais de um ano em lista de espera? Que liberdade existe para pensionistas que, após uma vida de trabalho, não têm sequer reformas que lhes permitam uma alimentação condigna e cuidados de saúde elementares? Que liberdade existe nas grandes cidades, e seus subúrbios, assolados pela insegurança e o medo? Que liberdade existe no interior de um País, descapitalizado e entregue e a si próprio, donde ainda se retiram as parcas infra-estruturas e equipamentos necessários ao seu desenvolvimento? Que liberdade existe num País em que os governantes nos falam da contenção salarial, como condição necessária para o arranque da economia e competitividade das empresas, mas eles, os que assim falam, têm rendimentos especulativos que envergonham e chocam o mais comum dos mortais?
Que liberdade existe quando a comunicação social, numa situação de pobreza extrema, se verga, até mais não, aos poderes económico e político manipulando as notícias e empobrecendo a informação? Que liberdade existe quando aumenta o número de excluídos que nos abordam nas ruas e que dão um espectáculo triste da nossa segurança e dos nossos valores? Que liberdade existe se, sistematicamente, estamos a ser bombardeados com fumos de corrupção e, investigue-se ou não, os fumos aumentam mas as culpas continuam a morrer solteiras?
E enquanto isso vamos assistindo ao show triste do principal partido da oposição, o PSD. A mediocridade e o conflito interno em que está mergulhado o partido laranja são, no mínimo, deprimentes. À ânsia desmesurada de poder de Luís Filipe Menezes junta-se um Marques Mendes diminuído que só serve os interesses daqueles a quem interessa manter controlado, e na área da insignificância, o maior partido da oposição.
Cavaco Silva, sabiamente, vai gerindo a crise para que não surjam roturas sobretudo agora que Portugal está com a presidência europeia. Os vetos do PR transmitem uma falsa ideia de demarcação em relação ao actual executivo. Inteligente como é Cavaco Silva depressa se apercebeu que a sua excessiva colagem a José Sócrates não era uma força mas sim uma fragilidade. Para ser uma força, e ter a simpatia dos descontentes e logo controladas as suas manifestações de revolta, havia que transmitir uma ideia de isenção e de independência que não creio que realmente existam. Numa coisa ou noutra, Cavaco Silva, poderá não estar de acordo mas, basicamente, o PR sabe que não tem alternativa e que, reduzida a actual estabilidade governativa, ficará de mãos vazias perante uma eventual crise política. Por essa razão os mais próximos de Cavaco Silva na área do PSD, apoiam Marques Mendes, o líder que nunca será primeiro-ministro e que vai alimentando o tricô político em período de vacas magras. Neste quadro político Sócrates ganhará as próximas eleições com uma maioria absoluta que andará pelos 10% dos votos dos eleitores inscritos dada a tendência de uma crescente abstenção. Mas as tensões sociais, essas não pararão de aumentar.
Autor: Silêncio Culpado

19 comentários:

Divinius disse...

Vim te deixar uma....*

quintarantino disse...

Digno de aparecer no Domingo à noite lá na RTP1... o azar é o nome não ser Marcelo ... Excelente.

O Profeta disse...

Saberás que um bando de gaivotas
Fugidas à fúria de alteroso mar
São pássaros perdidos do ninho
Que a bruma não deixa encontrar

Saberás também que o mar
Cavalga nas asas do vento
Em dias de forte tempestade
Aos olhos de um Neptuno atento

Bom fim de semana

Doce beijo

RDSER disse...

Parabens pelo texto.
abracinhos...

Manuel Veiga disse...

é um excelente artigo. gostei muito ler. louvavel a todos os títulos.

abraço

António de Almeida disse...

-O "azar" de Portugal é andar sempre fora do tempo certo, adiantamo-nos ou atrazamo-nos, senão vejamos, acabámos com a monarquia cedo de mais face ao resto da Europa, o que ganhámos? uma década de convulsões sociais com a ineficaz 1ª república, o estado novo surgiu no tempo certo, nos anos 20 como as restantes ditaduras europeias, Portugal ganhou a vantagem de escapar à guerra, mas deitou tudo a perder ao não se libertar da ditadura em meados da decada de 40, não experimentando o crescimento económico que a Europa viveu nos anos 50, libertando-nos da ditadura veio o inenarrável PREC destruir por completo a economia, estabelecida a normalidade ela assenta num bloco central ideológicamente muito próximo, que ocupa o estado parasitando-o, tornando-o completamente ineficaz nas suas diversas áreas de intervenção. Muito haveria a fazer em Portugal, que se fosse uma empresa em vez dum país, já teria aberto falência. Seria necessária muita coragem política para mudar o país, o que não existe.

Sol da meia noite disse...

Pois realmente o Portugal de Abril, perdeu-se na memória dos tempos...
Na época, eu estava a fazer 10 anos... Ficou-me pois a ideia desse tempo...
Hoje, tudo é relativo... do tanto que se conquistou.
Desinteresse de uns?... Interesse de outros?...

Beijinhos!

... disse...

Silêncio Culpado



Concordo absolutamente consigo.


Existe um poema de Rui belo que diz o meu pais é aquilo que o mar não quis.

Mais tarde enviarei o texto completo...


Cumprimentos e um bjs....

Meg disse...

E para abreviar, o líder que era para ser líder, nem vai ser 1º ministro.
Baralha-se e volta-se a dar...
Liberdades? Quais liberdades?

Um abraço

G Botelho disse...

Neste país passa-se fome, a marginalidade, as depressões, os suicidios,são um visível fruto da falta de esperança e de oportunidades, estamos irremediavelmente afogados, e a costa está tão longe.
Parabens pelo texto,
Beijo . Arco Íris.

Alda Inácio disse...

Quando se trata de política Portugal também se parece com o nosso Brasil, ali botamos fé no Lula que mudou a cara do país mas ainda queríamos mais....gosto das tuas reflexões maduras, conscientes...és muito firme no que dizes, abraço sincero amigo. Alda Inacio

Jorge P. Guedes disse...

É uma análise cuidada e bem estruturada.

Para mim, Cavaco aguarda o momento para lançar os seus favoritos, com a Ferreira Leite à cabeça. Mas atenção, que este Menezes é o Sócrates laranja. Não é parvo e é extremamente frio e manhoso.
E um ambicioso sem travões!

Abraço.

avelaneiraflorida disse...

A dança das cadeiras ...parte 34????

DS disse...

Uma sociedade que sobrepõe os valores económicos a todos os outros tem todas as hipóteses de entrar em colapso social. Mais que a pobreza é a ausência de solidariedade e valores humanos que nos isola cada vez mais uns dos outros e nos conduz ao desespero.

Pata Negra disse...

Estamos portanto num país que não respeita os Direitos do Homem. Ás vezes respondem-me:
- Mas pelo menos agora temos liberdade de expressão!
- A liberdade de expressão só existe se formos ouvidos!
- Mas agora temos eleições livres!
- Livres? O sistema de dois partidos iguais é o pior sistema a seguir ao sistema de um só partido!

SILÊNCIO CULPADO disse...

Netmito
Tenho ido visitar-te e encontro a porta fechada. Já não dá para comentar os teus belos poemas?
Um abraço

carlos filipe disse...

É uma análise feita com muita categoria por quem sabe do que está a falar.

NÓMADA disse...

Estão aqui muitos elogios a este texto e eu deixo mais um EXCELENTE. Óptimo para nos ajudar a ver a realidade sob várias perspectivas.

JOY disse...

Ora aqui está uma análise do pais actualmuito bem feita e realista, depois disto não há muito a dizer ,somos um pais de incoerências ,cerca de meio milhão de desempregados mais 200mil a viver com emprego precário e mal renumerado,e uma significativa parte da população a viver com o ordenado do mês a seguir mas os bancos continuam a apresentar lucros fabulosos , como é possivel ? Pagamos impostos ao nivel das melhores economias europeias com ordenados miseráveis para a grande maioria da população,
como é possivel ? Populações a terem de percorrer 50 ou 60 Km para terem cuidados básicos de saude , como é possivel Crianças a levantarem-se ás 6 da manhã e a regressarem a noite da escola que fica a dezenas de Km de distância , como é possivel ? Descontarmos uma vida inteira e chegar ao fim da vida prfissional sem garantia de reforma ? como é possivel ? Politicos incompetentes ,corruptos, mal formados, Não consiguo deixar de me questionar que Portugal é este ?

JOY